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domingo, 3 de fevereiro de 2013

Não é ele o filho do carpinteiro?


É dia de sábado na sinagoga de Nazaré e Jesus põe-Se a pregar aos presentes que, impressionados ou assustados, imediatamente começam a murmurar sobre a origem de tamanha sabedoria.  Ora, era aquele rapaz o filho de José, o carpinteiro.  O menino que certamente muitos haviam visto crescer a brincar pelas ruas de Nazaré ou a ajudar seu pai no ofício da carpintaria.  Como agora falava com tal autoridade sobre as coisas de Deus?

A dureza dos corações cegou os homens não lhes permitindo reconhecer e entender o que acontecia e, por isso, era mais fácil rechaçar o jovem, atribuindo-lhe o adjetivo de louco ou desorientado e despachá-lo dali para que não desonrasse mais o nome de Deus.


Pregava-lhe sobre o amor de Deus, sobre o cumprimento das Escrituras, mas não lhes davam ouvido.  Adiante, Jesus falará que Deus revelar-se-á aos pequeninos, aos que têm coração puro, deixando claro que não é o muito saber que demonstra maior ou menor conhecimento ou intimidade com Deus.  É uma chamada de atenção para que purifiquemos nossos corações, para que deixemos os estereótipos de lado e reconheçamos que Deus se revela, sim, no filho do carpinteiro, no pescador, no lixeiro, em cada um, enfim, por mais comezinha que seja sua vida, por menor que pareça aos olhos do mundo.


Jesus tentou revelar ao seu povo as maravilhas do amor de Deus.  Tentou trazê-los para perto do Pai e fazê-los reconhecer a misericórdia do Senhor.  Mas o coração endurecido de seus pares não o aceitou.  Afinal, era apenas o filho do carpinteiro.

Segue, então, Seu caminho, sabendo que não era aceito em sua própria cidade.  Sua história não mostra grandes milagres em Nazaré.  Nem, tampouco, grandes sermões.  Curou alguns doentes e pregava nas cidades como dirá o Evangelho (Mc 6, 6).  Vivia, enfim, o que o profeta Ezequiel havia predito: “Quer te ouçam ou não – pois é uma raça indomável – hão de ficar sabendo que há um profeta no meio deles!” (Ez 2,5)

E o povo continuou sabendo e tendo notícias do carpinteiro.  Assim como nós conhecemos Sua história.  E continuamos a procurá-Lo no sábio, no vistoso, no rico, no intelectual ou no culto.  Esquecemo-nos do simples e complicamos o caminho até Deus.  Até quando?

Para sua reflexão:
Mc 6, 1-6
Ez 2, 2-5

Por Gilda Carvalho
Site: amaivos


Pregações: Homilias - Não é este o filho de José?

por São Boaventura

Comentário ao Evangelho do dia feito por São Boaventura (1221-1274), Franciscano, Doutor da Igreja

Meditações sobre a vida de Cristo; Opera omnia, t. 12, pp. 530ss.

Evangelho segundo São Lucas (Lc), capítulo 4

16 Dirigiu-se a Nazaré, onde se havia criado. Entrou na sinagoga em dia de sábado, segundo o seu costume, e levantou-se para ler.
17 Foi-lhe dado o livro do profeta Isaías. Desenrolando o livro, escolheu a passagem onde está escrito (61,1s.):
18 O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu, e enviou-me para anunciar a boa nova aos pobres, para sarar os contritos de coração,
19 para anunciar aos cativos a redenção, aos cegos a restauração da vista, para pôr em liberdade os cativos, para publicar o ano da graça do Senhor.
20 E enrolando o livro, deu-o ao ministro e sentou-se, todos quantos estavam na sinagoga tinham os olhos fixos nele.
21 Ele começou a dizer-lhes: Hoje se cumpriu este oráculo que vós acabais de ouvir.
22 Todos lhe davam testemunho e se admiravam das palavras de graça, que procediam da sua boca, e diziam: Não é este o filho de José?
23 Então lhes disse: Sem dúvida me citareis este provérbio: Médico, cura-te a ti mesmo, todas as maravilhas que fizeste em Cafarnaum, segundo ouvimos dizer, faze-o também aqui na tua pátria.
24 E acrescentou: Em verdade vos digo: nenhum profeta é bem aceito na sua pátria.
25 Em verdade vos digo: muitas viúvas havia em Israel, no tempo de Elias, quando se fechou o céu por três anos e meio e houve grande fome por toda a terra,
26 mas a nenhuma delas foi mandado Elias, senão a uma viúva em Sarepta, na Sidônia.
27 Igualmente havia muitos leprosos em Israel, no tempo do profeta Eliseu, mas nenhum deles foi limpo, senão o sírio Naamã.
28 A estas palavras, encheram-se todos de cólera na sinagoga.
29 Levantaram-se e lançaram-no fora da cidade, e conduziram-no até o alto do monte sobre o qual estava construída a sua cidade, e queriam precipitá-lo dali abaixo.
30 Ele, porém, passou por entre eles e retirou-se.

«Não é este o filho de José?»


Parecem ter alcançado o grau mais elevado esses que, com todo o coração e sem fingimento, são de tal maneira senhores de si, que nada mais procuram do que ser desprezados, não ser tidos em conta e viver na humildade. [...] Enquanto não chegardes aí, pensai que nada fizestes. Com efeito, como somos todos «servos inúteis», nas palavras do Senhor (Lc 17, 10), mesmo que façamos tudo bem, enquanto não alcançarmos este grau de humildade não estaremos na verdade, mas estaremos e caminharemos na vaidade. [...]



Sabes também que o Senhor Jesus começou por fazer antes de ensinar. Mais tarde, haveria de dizer: «Aprendei de Mim que sou manso e humilde de coração» (Mt 11, 29). E quis praticá-lo realmente, sem fingimento. Fê-lo de todo o coração, como era manso e humilde de todo o coração e em verdade. N'Ele não havia dissimulação (cf. 2Cor 1, 19). Estava de tal maneira mergulhado na humildade, no desprezo e na abjecção, aniquilara-Se de tal maneira aos olhos de todos, que quando começou a pregar e a anunciar as maravilhas de Deus, e a fazer milagres e coisas admiráveis, ninguém Lhe dava valor, antes O desprezavam e troçavam Dele dizendo: «Não é este o filho do carpinteiro?», e outras coisas parecidas. Assim se cumpre a palavra de São Paulo: «Aniquilou-Se a Si mesmo, tomando a condição de servo» (Fil 2, 7), e não apenas de servo comum, pela encarnação, mas de um servo inútil, através da Sua vida humilde e desprezada.

São Boaventura

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