REPRODUÇÃO
Dia 26 de setembro é data que a Igreja Católica reverência a memória dos santos mártires Cosme e Damião. Entretanto, não somente o catolicismo cultua a memória destes dois ícones religiosos, como também são reverenciados pelo candoblé e pela Umbanda no dia 27 de setembro. Os gêmeos, cujos relatos atestam que eram originários da Arábia, de uma família nobre de pais cristãos, no século III. Estudaram medicina na Síria e depois foram praticá-la.
Os Santos taumaturgos e anárgiros
(inimigos do dinheiro) vindos da Mesopotâmia nasceram na Ásia Menor. Seu
pai, um nobre pagão, morreu enquanto eles ainda eram crianças, e sua mãe,
Teodora, os criou na fé cristã. De acordo com a Lenda Áurea, de Jacop de
Voragine, Cosme e Damião eram gêmeos e últimos de um grupo de cinco irmãos, que
se chamavam Antino, Leôncio, Euprépio, Cosme e
Damião.
Seguindo o exemplo de vida de sua mãe
e em imitação a Cristo, os gêmeos tornaram-se homens justos e
virtuosos.
Ao
alcançarem a idade a adulta, estudaram medicina e as artes da cura, e por sua
virtude cristã, receberam do Espírito Santo o dom de cura as enfermidades do
corpo e da alma através de sua oração.Por amor a Deus e ao próximo, eles jamais
cobraram por seus serviços, seguindo estritamente o mandamento de Jesus Cristo:
"Recebestes de graça, de graça
dai!" (Mt. 10:8). Eles
tratavam até mesmo os
animais.
A fama dos Santos Cosme e Damião,
cujos nomes verdadeiros eram Acta e Passio, se espalhou por toda a região da
Mesopotâmia, e o povo apelidou os irmãos de médicos anárgiros, ou seja,
"aqueles que não recebem prata (dinheiro)". Segundo relatos da
Lenda Áurea, não empregavam a terapêutica tão
usada naquele tempo de absurdas invocações, coisa que pudesse supor como
imbuídas de mágicas
artes.
Um certo dia, os santos foram
chamados para atender uma senhora acometida de uma doença incurável, de nome
Paládia, a quem todos os médicos recusaram-se a tratar.
Pela fé, oração e pelos santos dons
dos irmãos, Paládia foi curada, que logo em seguida levantou-se de seu leito,
com perfeita saúde, para agradecer a
Deus.
Desejando recompensar seus médicos de
algum modo, em um gesto de gratidão a idosa senhora foi conversar com Damião, e
lhe presenteou com três ovos, dizendo
"Aceite este pequeno presente em nome
do Pai, do Filho e do Espírito
Santo". Ao ouvir o nome da Santíssima Trindade, o santo
médico não ousou recusar o
presente.
No entanto, quando Cosme soube o que
acontecera, entristeceu-se, pois acreditava que seu irmão havia quebrado seu
voto de caridade, e declarou perante testemunhas e os tres outros irmãos que
não iria permitir que seus restos mortais fossem enterrados com os de Damião. Entretanto, na mesma noite, Cosme
teve uma visão do próprio Cristo, que disse:
"Cosme, me ouve. Damião não tem culpa,
pois ele aceitou a dádiva de Paládia apenas por
caridade".
Em
Roma, Diocleciano e Maximiniano tinham resolvido perseguir os cristãos até a
exterminação total. E Lisias, nomeado procônsul do Império Romano em Egéia, Cilícia,
na ásia Menor, obstinou-se de igual modo, na política de perseguição aos que
teimavam em professar a religião dos
cristãos.
Como acontece com tantos outros
santos da Igreja Católica, a vida dos santos gêmeos está mergulhada em lendas
misturadas à história real. De acordo com os relatos da Lenda
Áurea,
do dominicano arcebispo de Gênova, Jacop de Voragine (1230-1298), os santos irmãos
foram chamados perante ao procônsul Lísias, na Egéia, que tendo ciência da fama
dos santos médicos, resolveu averiguar. Entretanto, quando Lisias
resolveu convidá-los para uma celebração em honra aos deuses do Império, Cosme
e Damião recusaram, com que fez que Lisias desse voz de prisão aos dois gêmeos.
Os três outros irmãos de Cosme e Damião também foram
capturados.
As narrativas dos suplícios pelos quais os santos Cosme e
Damião teriam passado são das mais fantásticas. Primeiro,
foram crucificados, entretanto os pregos não conseguiam furar suas mãos;
depois, Lisias mandou que fossem para um penhasco e lançados ao mar, mas um
anjo conseguiu resgatá-los; Posteriormente, quando Lísias avistou tais
milagres, propôs um negócio aos dois irmãos: queria que os santos médicos
ensinassem a ele os "sortilégios das magias", e que associados,
poderiam ser os homens mais ricos da terra, proposta esta que os santos
imediatamente recusaram, pois "só o Poder de Deus e a fé poderiam obrar
tais maravilhas". Revoltado, Lisias quis agredi-los, tomado de grande
fúria, mas dois negros demônios, espíritos do mal, se apossaram dele, que
se desesperou e invocou a intercessão dos dois santos, que prontamente se
apiedaram de seu algoz e rezaram para que tais espíritos deixassem o procônsul, deixando-o em paz. Entretanto , nem isso foi capaz de sensibilizar
o magistrado, que viu nisto um aviso dos deuses romanos por ele ter renegado a
certo momento sua crença e pela irritabilidade dos deuses para com os
santos.
Posteriormente, Lisias mandou que se
fizessem uma grande fogueira e que os anágiros fossem lançado as chamas,
contudo elas não o atingiram, que em vez disso, atingiram os carrascos; Após,
amarram os santos a caudas dos cavalos para que fossem arrastados por terra,
para que assim tivessem seus corpos esfacelados. Não resultou, pois a sensação
que tiveram foram de "flutuar no espaço". Em vez disso, os cavaleiros
galopantes é que se cansaram de tanta força desperdiçada; Lísias, depois,
mandou que os santos fossem amarrados a cruzes e apedrejados, contudo nenhuma
pedra os atingiu, e em vez disso, as pedras se lançavam contra os agressores
que arremessavam - e a mesma coisa aconteceu em relação aos flecheiros, que
todavia foram mortos; Por fim, chegado a hora dos santos irem para a
Eternidade, um anjo apareceu aos santos irmãos e aos outros três no cárcere,
que anunciou que ao romper do dia, eles seriam levados a Vida Eterna. E
iluminados pela esperança divina, os cinco irmãos foram conduzidos ao lugar
onde foram, por fim,
decapitados.
Ainda de acordo com a
Lenda
Áurea, houve um súbito terremoto e chuvas
de sangue, que fez com que Lísias e sua corte fugissem do palácio. Aproveitando
a fuga dos algozes dos santos mártires Cosme e Damião, um grupo de cristãos,
que estavam ocultos, resolveram levar as exéquias dos mártires para dar
sepultura, e apanharam os corpos dos cinco mártires do palácio e os levaram
para o campo. Nisso, uma das testemunhas das palavras de Cosme, que havia
pedido para não ser enterrado no sepulcro do irmão Damião devido a dádiva de
Peládia, lembrou do caso, mas de súbito, uma mula de um transeunte que passava
por aquele local falou:
"Os cinco irmãos devem ser enterrados
juntos. Damião aceitou a
dádiva da mulher apenas por
caridade". Espantados, os
cristãos assim o fizeram e encararam a advertência da mula como um milagre. Dai encerra as narrativas
fantásticas de São Cosme e São Damião, segundo Voragine
em
sua Lenda
Áurea.
Seus restos mortais foram
transportados para a cidade de Cira, na Síria, e depositados numa igreja a eles
consagrada. No século VI uma parte das relíquias foi levada para Roma e
depositada na igreja que adotou o nome dos santos. Outra parte dela foi
guardada no altar-mor da igreja de São Miguel, em Munique, na Baviera. Os
santos gêmeos são cultuados em toda a Europa, especialmente Itália, França,
Espanha e Portugal. Em 1530, na cidade de Igaraçu, em Pernambuco, foi
construída uma igreja em sua
homenagem.
Depois de mortos,
apareceram ajudando crianças que sofriam violências. Ao
gêmeo Acta é atribuído o milagre da levitação e ao gêmeo Passio a tranqüilidade
da aceitação do seu martírio. A partir do século V os milagres de cura
atribuídos aos gêmeos fizeram com que passassem a ser considerados médicos,
pois, quando em vida, exerciam a medicina na Síria, em Egéia e Ásia Menor, sem
receber qualquer pagamento. Por isso, eram chamados de anargiros, ou seja,
inimigos do dinheiro. Mais tarde, foram escolhidos patronos dos cirurgiões.
Cosme e Damião são venerados como
padroeiros dos médicos e farmacêuticos, e por causa da sua simplicidade e
inocência também são invocados como protetores das crianças.
O
culto aos dois irmãos é muito antigo, havendo registros sobre eles desde o
século 5, que relatam a existência, em certas igrejas, de um óleo santo, que
lhes levava o nome, que tinha o poder de curar doenças e dar filhos às mulheres
estéreis.
Esforços foram feitos para demonstrar que Cosme e Damião não
existiram de fato, que eram apenas as versões cristãs dos pagãos Dioscuros-
Castor e Pólux, filhos de Zeus, contudo isto não é verdade, embora haja
evidências de que a superstição popular muitas vezes os aproximou e de que em
seu culto havia uma adaptação do costume pagão conhecido como
"incubação": a pessoa doente dormia na igreja dedicada aso santos
esperando ser favorecida com um sonho que lhe mostraria o caminho da cura.
Aqui no Brasil, a devoção trazida pelos portugueses
misturou-se com o culto aos orixás-meninos (Ibjis ou Erês) da tradição africana
yoruba. São Cosme e São Damião, os santos mabaças ou gêmeos, são tão
populares quanto Santo Antônio e São João. São amplamente festejados na Bahia e
no Rio de Janeiro, onde sua festa ganha a rua e adentra aos barracões de
candomblé e terreiros de umbanda, no dia 27. No dia 27 as crianças saem às ruas
para pedir doces e esmolas em nome dos santos e, as famílias aproveitam para
fazer um grande almoço, servindo a comida típica da data: o chamado caruru dos
meninos.
Segundo a lenda africana, os
orixás-crianças são filhos de Iemanjá, a rainha das águas e de Oxalá, o pai de
toda a criação. Outras tradições atribuem a paternidade dos mabaças
(gêmeos) a Xangô, tanto que a comida servida aos Ibejís ou Erês, chamados
também carinhosamente de “crianças” é a mesma que é oferecida a Xangô, o senhor
dos raios, o caruru. Uma característica marcante na Umbanda e no Candomblé em
relação às representações de São Cosme e São Damião é que junto aos dois santos
católicos aparece uma criancinha vestida igual a eles. Essa criança é chamada
de Doúm ou Idowu, que personifica as crianças com idade de até sete (7) anos de
idade, sendo ele o protetor das crianças nessa faixa de idade. Junto com o
caruru são servidas também as comidas de cada orixá, e enquanto as crianças se
deliciam com a iguaria sagrada, à sua volta, os adultos cantam cânticos
sagrados (oríns) aos
orixás.
Principalmente na Bahia, onde muitas famílias realizam o
tradicional caruru oferecido a sete meninos, é dia de festa. Também é
comum a distribuição de balas de mel e brinquedos, este hábito também se
observa em outras cidades do país.
No Brasil, em 1530, a igreja de
Iguaraçu, em Pernambuco, consagrou Cosme e Damião como padroeiros. No
dia 27 de setembro, quando é realizada a festa aos santos gêmeos, as igrejas e
os templos das religiões afro-brasileiras são enfeitadas com bandeirolas e
alegres desenhos. Ao contrário do que muitos imaginam, foi em Igarassu e não em
Olinda que os portugueses inicialmente se estabeleceram. A localidade de Sítio
dos Marcos já contava em 1516 com um dos principais ancoradouros do litoral
brasileiro. A cidade de Igarassu, segundo a tradição, foi fundada em 27 de
setembro de 1535, após a vitória dos portugueses sobre os índios Caetés e por
ordem do Capitão Afonso Gonçalves – que mandou erigir no local da vitória uma
capela votiva consagrada aos Santos Cosme e Damião – hoje a mais antiga do
Brasil.
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