É dia de
sábado na sinagoga de Nazaré e Jesus põe-Se a pregar aos presentes que,
impressionados ou assustados, imediatamente começam a murmurar sobre a origem
de tamanha sabedoria. Ora, era aquele
rapaz o filho de José, o carpinteiro. O
menino que certamente muitos haviam visto crescer a brincar pelas ruas de
Nazaré ou a ajudar seu pai no ofício da carpintaria. Como agora falava com tal autoridade sobre as
coisas de Deus?
A dureza dos
corações cegou os homens não lhes permitindo reconhecer e entender o que
acontecia e, por isso, era mais fácil rechaçar o jovem, atribuindo-lhe o
adjetivo de louco ou desorientado e despachá-lo dali para que não desonrasse
mais o nome de Deus.
Jesus tentou
revelar ao seu povo as maravilhas do amor de Deus. Tentou trazê-los para perto do Pai e fazê-los
reconhecer a misericórdia do Senhor. Mas
o coração endurecido de seus pares não o aceitou. Afinal, era apenas o filho do carpinteiro.
Segue,
então, Seu caminho, sabendo que não era aceito em sua própria cidade. Sua história não mostra grandes milagres em
Nazaré. Nem, tampouco, grandes sermões. Curou alguns doentes e pregava nas cidades
como dirá o Evangelho (Mc 6, 6). Vivia,
enfim, o que o profeta Ezequiel havia predito: “Quer te ouçam ou não – pois é
uma raça indomável – hão de ficar sabendo que há um profeta no meio deles!” (Ez
2,5)
E o povo
continuou sabendo e tendo notícias do carpinteiro. Assim como nós conhecemos Sua história. E continuamos a procurá-Lo no sábio, no
vistoso, no rico, no intelectual ou no culto.
Esquecemo-nos do simples e complicamos o caminho até Deus. Até quando?
Para sua
reflexão:
Mc 6, 1-6
Ez 2, 2-5
Por Gilda Carvalho
Site: amaivos
Pregações: Homilias - Não é este o
filho de José? -
por São Boaventura
Comentário
ao Evangelho do dia feito por São Boaventura (1221-1274), Franciscano, Doutor
da Igreja
Meditações
sobre a vida de Cristo; Opera omnia, t. 12, pp. 530ss.
Evangelho
segundo São Lucas (Lc), capítulo 4
16
Dirigiu-se a Nazaré, onde se havia criado. Entrou na sinagoga em dia de sábado,
segundo o seu costume, e levantou-se para ler.
17 Foi-lhe
dado o livro do profeta Isaías. Desenrolando o livro, escolheu a passagem onde
está escrito (61,1s.):
18 O
Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu, e enviou-me para anunciar a
boa nova aos pobres, para sarar os contritos de coração,
19 para
anunciar aos cativos a redenção, aos cegos a restauração da vista, para pôr em
liberdade os cativos, para publicar o ano da graça do Senhor.
20 E
enrolando o livro, deu-o ao ministro e sentou-se, todos quantos estavam na
sinagoga tinham os olhos fixos nele.
21 Ele
começou a dizer-lhes: Hoje se cumpriu este oráculo que vós acabais de ouvir.
22 Todos lhe
davam testemunho e se admiravam das palavras de graça, que procediam da sua
boca, e diziam: Não é este o filho de José?
23 Então
lhes disse: Sem dúvida me citareis este provérbio: Médico, cura-te a ti mesmo,
todas as maravilhas que fizeste em Cafarnaum, segundo ouvimos dizer, faze-o
também aqui na tua pátria.
24 E
acrescentou: Em verdade vos digo: nenhum profeta é bem aceito na sua pátria.
25 Em
verdade vos digo: muitas viúvas havia em Israel, no tempo de Elias, quando se
fechou o céu por três anos e meio e houve grande fome por toda a terra,
26 mas a
nenhuma delas foi mandado Elias, senão a uma viúva em Sarepta, na Sidônia.
27
Igualmente havia muitos leprosos em Israel, no tempo do profeta Eliseu, mas
nenhum deles foi limpo, senão o sírio Naamã.
28 A estas
palavras, encheram-se todos de cólera na sinagoga.
29
Levantaram-se e lançaram-no fora da cidade, e conduziram-no até o alto do monte
sobre o qual estava construída a sua cidade, e queriam precipitá-lo dali
abaixo.
30 Ele,
porém, passou por entre eles e retirou-se.
«Não é este
o filho de José?»
Parecem ter
alcançado o grau mais elevado esses que, com todo o coração e sem fingimento,
são de tal maneira senhores de si, que nada mais procuram do que ser
desprezados, não ser tidos em conta e viver na humildade. [...] Enquanto não
chegardes aí, pensai que nada fizestes. Com efeito, como somos todos «servos
inúteis», nas palavras do Senhor (Lc 17, 10), mesmo que façamos tudo bem,
enquanto não alcançarmos este grau de humildade não estaremos na verdade, mas
estaremos e caminharemos na vaidade. [...]
Sabes também
que o Senhor Jesus começou por fazer antes de ensinar. Mais tarde, haveria de
dizer: «Aprendei de Mim que sou manso e humilde de coração» (Mt 11, 29). E quis
praticá-lo realmente, sem fingimento. Fê-lo de todo o coração, como era manso e
humilde de todo o coração e em verdade. N'Ele não havia dissimulação (cf. 2Cor
1, 19). Estava de tal maneira mergulhado na humildade, no desprezo e na
abjecção, aniquilara-Se de tal maneira aos olhos de todos, que quando começou a
pregar e a anunciar as maravilhas de Deus, e a fazer milagres e coisas
admiráveis, ninguém Lhe dava valor, antes O desprezavam e troçavam Dele
dizendo: «Não é este o filho do carpinteiro?», e outras coisas parecidas. Assim
se cumpre a palavra de São Paulo: «Aniquilou-Se a Si mesmo, tomando a condição
de servo» (Fil 2, 7), e não apenas de servo comum, pela encarnação, mas de um
servo inútil, através da Sua vida humilde e desprezada.
São
Boaventura
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